Designed by Freepik – Ingestão de óleos essenciais
Os óleos essenciais são substâncias voláteis extraídas de plantas, contendo uma alta concentração de compostos com atividade biológica. Eles têm se tornado cada vez mais populares, tanto em tratamentos complementares quanto em rotinas de bem-estar. Desde a antiguidade, esses óleos têm sido utilizados por suas propriedades terapêuticas, seja para alívio de dores, promoção de relaxamento ou como auxiliares no tratamento de doenças. No entanto, com o aumento de seu uso, surge também a necessidade de entender e aplicar diretrizes de segurança, especialmente quando se trata da ingestão desses compostos altamente concentrados. Este guia busca oferecer uma compreensão abrangente sobre a segurança na ingestão de óleos essenciais, abordando os benefícios, os riscos e as melhores práticas para seu uso seguro.
O que são óleos essenciais e como são extraídos?
Óleos essenciais são derivados altamente concentrados extraídos de várias partes de plantas; folhas, galhos, flores e flores, frutas, sementes, cascas, raízes e assim por diante. Por exemplo:
- São necessários 2.500 a 4.000 kg de pétalas de rosa para produzir 1 kg de óleo essencial.
- São necessários 1,4 kg de lavanda fresca para produzir 15 ml de óleo essencial de lavanda.
- Uma gota de óleo essencial equivale (em relação à concentração ou quantidade de substâncias) a 15 a 40 xícaras de chá medicinal, ou até 10 colheres de chá de tintura.
Os óleos essenciais são compostos de uma mistura complexa de substâncias químicas naturais, como terpenos, álcoois, aldeídos, cetonas, ésteres e ácidos orgânicos. Essas substâncias são responsáveis pelo aroma característico de cada óleo e, mais importante, pelas suas propriedades terapêuticas. Por exemplo, o mentol, encontrado no óleo de hortelã-pimenta, é conhecido por suas propriedades refrescantes e analgésicas, enquanto o eugenol, presente no óleo de cravo, tem efeitos anestésicos e antimicrobianos.
Os métodos mais comuns de extração de óleos essenciais incluem a destilação a vapor e a prensagem a frio. Na destilação a vapor, o vapor é passado através do material vegetal, vaporizando os compostos voláteis. O vapor é então condensado, e o óleo essencial é separado da água. A prensagem a frio é utilizada principalmente para extrair óleos de cascas de frutas cítricas, onde a pressão é aplicada para liberar o óleo.Historicamente, os óleos essenciais foram usados em rituais religiosos, práticas de cura e como fragrâncias naturais. Nos tempos modernos, seu uso se expandiu para incluir a aromaterapia, tratamentos de pele, e até mesmo aplicações culinárias em alguns casos. No entanto, a prática de ingerir óleos essenciais é relativamente nova e controversa, necessitando de uma análise cuidadosa. Portanto, os óleos essenciais devem ser usados e aplicados com cautela, consideração cuidadosa e moderação.
Benefícios e riscos da ingestão de óleos essenciais
Atenção: óleos essenciais não devem ser ingeridos, a menos que prescritos e administrados por um profissional de saúde, farmacêutico ou herbalista que também seja um profissional de óleo essencial treinado e qualificado – a presente autora, mesmo sendo farmacêutica, não defende o uso interno de óleos essenciais em nenhuma outra circunstância, seja por via oral, retal ou vaginal.
A ingestão de óleos essenciais tem sido promovida por alguns como uma forma poderosa de obter benefícios terapêuticos. Defensores afirmam que certos óleos podem auxiliar na digestão, melhorar o sistema imunológico e combater infecções. Por exemplo, o óleo de limão é frequentemente citado por suas propriedades desintoxicantes, enquanto o óleo de orégano é conhecido por sua ação antimicrobiana.
Embora existam alguns estudos que apoiam a eficácia dos óleos essenciais quando ingeridos, a maioria das pesquisas disponíveis se concentra em seu uso tópico ou inalação. A falta de estudos clínicos robustos sobre a segurança e eficácia da ingestão limita a recomendação dessa prática por profissionais de saúde. É importante que qualquer uso interno de óleos essenciais seja embasado em evidências científicas sólidas, algo que ainda está em desenvolvimento.
A farmacocinética, que estuda como as substâncias são absorvidas, distribuídas, metabolizadas e excretadas pelo corpo, é altamente variável e pouco compreendida no caso dos óleos essenciais. A falta de estudos científicos robustos e regulamentações claras também faz com que não saibamos ao certo como a ingestão de óleos essenciais pode afetar órgãos como fígado e rins.
Os óleos essenciais são altamente concentrados, o que significa que uma pequena quantidade pode ter um efeito muito potente. Isso aumenta o risco de toxicidade quando ingeridos, especialmente se forem consumidos sem diluição ou em doses elevadas. Entre os riscos documentados estão danos ao fígado e aos rins, irritação gastrointestinal, e reações alérgicas severas.
Vários casos de toxicidade por ingestão de óleos essenciais têm sido relatados na literatura médica. Estes incluem desde irritação leve até envenenamento grave, dependendo do tipo de óleo e da quantidade ingerida. Um caso notório envolveu uma criança que ingeriu óleo de eucalipto e sofreu uma depressão respiratória severa, exigindo tratamento de emergência (Tabela 1).
Tabela 1: Intoxicação por óleos essenciais específicos após ingestão oral aguda
Óleo Essencial | Sinais e Sintomas |
Cânfora | Inicialmente, estimulação do SNC (delírio, convulsões), seguida de depressão (ataxia, coma). Possivelmente náusea, vômito, vertigem, confusão, insuficiência respiratória |
Casca de Canela | Sensação de queimação na boca, tórax e estômago, tontura, visão dupla, náusea, vômito, colapso |
Citronela | Vômito, choque, espuma na boca, febre, respiração rápida e profunda, cianose, convulsões |
Cravo | Acidose, deterioração da função hepática, depressão do SNC, coma profundo, convulsões, cetonúria, hipoglicemia |
Eucalipto | Depressão do SNC (sonolência, coma), respiração anormal (superficial ou difícil), pupilas pontuais, ataxia, vertigem, dor epigástrica, vômito, fraqueza nas pernas, suor frio, dor de cabeça |
Hissopo | Convulsões |
Salsinha/apiol | Febre, dor abdominal severa, sangramento vaginal, vômito, diarreia |
Poejo | Febre, delírio, náusea, vômito, tontura, coma, formigamento e dormência das extremidades, hemorragia |
Pinheiro | Sonolência, delírio, dor de cabeça, náusea, ataxia, taquicardia, paresia, gastroenterite, insuficiência renal tóxica |
Sálvia (Dalmácia) | Convulsões |
Tuia | Convulsões, gastroenterite, flatulência, hipotensão |
Sassafrás | Principalmente choque, vômito. Depressão do SNC causando inadequação respiratória e circulatória. Quadro clínico similar ao do eucalipto, exceto por pupilas pontuais |
Melaleuca (Tea Tree) | Convulsões, ataxia, sonolência |
Salicilato de metila/Wintergreen | Convulsões, vômito, febre, respiração rápida e profunda, cianose, taquicardia, alcalose respiratória, zumbido, surdez |
Wormseed | Edema generalizado, irritação da pele e mucosas, dor de cabeça, vertigem, zumbido, visão dupla, náusea, vômito, constipação, surdez, cegueira |
Fonte: Tisserand (2014)
Antes de considerar a ingestão de óleos essenciais, é imperativo consultar um profissional de saúde qualificado. Aromaterapeutas certificados, médicos e farmacêuticos especializados em fitoterapia são os mais indicados para aconselhar sobre o uso seguro desses compostos. Eles podem avaliar fatores como a saúde geral do paciente, possíveis interações medicamentosas, e a dose apropriada, se for o caso.
Uso seguro para diferentes grupos de risco
Grupos específicos, como crianças, gestantes, idosos e pessoas com condições de saúde pré-existentes, correm maior risco de sofrer efeitos adversos com a ingestão de óleos essenciais. Por exemplo, mulheres grávidas devem evitar certos óleos, como o óleo de sálvia, que pode induzir contrações uterinas. Crianças são particularmente sensíveis, e muitos óleos, como o de hortelã-pimenta, não são recomendados para ingestão por crianças devido ao risco de toxicidade.
Interações Medicamentosas
Os óleos essenciais possuem compostos ativos que podem interagir com medicamentos prescritos, aumentando ou diminuindo sua eficácia, o que pode resultar em complicações graves, por exemplo:
- O óleo de bétula doce, que contém salicilato de metila, pode potencializar os efeitos de anticoagulantes, como a varfarina, aumentando o risco de sangramentos.
- O óleo essencial de limão, quando ingerido, pode interferir com medicamentos fotossensibilizantes, elevando o risco de queimaduras solares graves.
- Pacientes que tomam medicamentos para controle de glicose no sangue, como insulina ou metformina, também devem evitar a ingestão de óleos essenciais, como o óleo de canela, que pode aumentar a sensibilidade à insulina de forma perigosa.
Legislação e Regulamentação
A regulamentação sobre a ingestão de óleos essenciais varia amplamente entre países. No Brasil, a regulamentação do uso de óleos essenciais abrange suas aplicações terapêuticas, cosméticas e como flavorizantes, sendo a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) a responsável por essa normatização. No contexto terapêutico, a ANVISA classifica os óleos essenciais (ou óleos voláteis) como derivados vegetais utilizados em medicamentos fitoterápicos. Especificamente em relação ao uso oral desses óleos essenciais, a ANVISA fornece orientações no Formulário de Fitoterápicos da Farmacopeia Brasileira – 2ª edição, destacando apenas dois óleos essenciais: Allium sativum L. (alho) e Eucalyptus globulus (eucalipto). Não há, até o momento, a autorização para a ingestão de outros óleos essenciais, refletindo um enfoque cauteloso sobre seu uso interno.
No Reino Unido, qualquer produto contendo óleos essenciais destinado à ingestão é classificado como medicamento, sujeitando-o a regulamentações rigorosas. Nos Estados Unidos, a FDA regula óleos essenciais usados em alimentos e medicamentos, mas a supervisão é menos rigorosa em relação aos suplementos alimentares, permitindo brechas na segurança do consumidor.
Os produtos contendo óleos essenciais devem seguir padrões estritos de pureza e qualidade para serem considerados seguros para ingestão. No entanto, a falta de padronização global significa que a qualidade pode variar significativamente de um produto para outro. Os consumidores devem estar cientes da origem dos óleos essenciais que utilizam e buscar marcas que sigam boas práticas de fabricação.
Mesmo com regulamentações em vigor, a fiscalização pode ser inadequada, especialmente no mercado de suplementos alimentares. Isso resulta em produtos que podem conter contaminantes ou serem adulterados, colocando os consumidores em risco. A educação do consumidor é vital para evitar a compra e o uso de produtos de baixa qualidade.
Alternativas seguras para o uso de óleos essenciais
Nesse artigo eu ensino 12 maneiras eficazes e seguras para utilização dos óleos essenciais. De forma resumida, as formas mais seguras de uso de óleos essenciais são:
- Inalação: A inalação de óleos essenciais é uma forma segura e eficaz de aproveitar seus benefícios. Quando inalados, os compostos voláteis dos óleos entram diretamente no sistema olfativo, afetando o sistema límbico do cérebro, que está associado às emoções e à memória. Essa prática é especialmente eficaz no alívio de sintomas respiratórios, como congestão nasal, e na promoção de relaxamento.
- Aplicação Tópica: Quando diluídos adequadamente em óleos carreadores, os óleos essenciais podem ser aplicados na pele para tratar uma variedade de condições, desde dores musculares até problemas dermatológicos. A aplicação tópica evita os riscos associados à ingestão, desde que os óleos sejam adequadamente diluídos e testados para reações alérgicas.
Orientações específicas para profissionais de saúde
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- Avaliação de pacientes antes de recomendar ingestão: Os profissionais de saúde devem realizar uma avaliação abrangente dos pacientes antes de recomendar a ingestão de óleos essenciais. Isso inclui a análise de histórico médico, medicamentos em uso, e a presença de condições crônicas que possam ser agravadas pelos óleos. A dosagem deve ser ajustada de acordo com o estado de saúde do paciente e as diretrizes clínicas.
- Dosagem e Formulação: A dosagem segura de óleos essenciais para ingestão é um dos aspectos mais críticos, e deve ser determinada com base em pesquisas científicas e experiência clínica. Os profissionais devem formular as preparações com base em veículos apropriados e concentrações seguras, evitando o uso de óleos essenciais puros ou em concentrações elevadas.
- Aconselhamento sobre sinais de toxicidade: É essencial que os pacientes sejam informados sobre os sinais precoces de toxicidade ao ingerir óleos essenciais. Sintomas como náuseas, vômitos, dor abdominal, tontura, e sinais de reação alérgica, como urticária ou inchaço, devem ser imediatamente relatados a um profissional de saúde. Orientar os pacientes sobre a importância de parar o uso ao primeiro sinal de mal-estar é crucial para evitar complicações graves.
Educação e conscientização do consumidor
Os consumidores devem buscar fontes confiáveis de informação antes de iniciar o uso de óleos essenciais, especialmente para ingestão. Livros de referência, cursos sobre aromaterapia, e conselhos de profissionais de saúde são recursos valiosos. A desinformação na internet pode levar ao uso inadequado e perigoso desses produtos, por isso, é vital que os consumidores sejam críticos ao avaliar as fontes de informação.
Seguir as diretrizes de segurança para o uso de óleos essenciais é fundamental para garantir a saúde e o bem-estar. O uso irresponsável pode resultar em sérios danos à saúde, como intoxicação, reações alérgicas graves, e interações medicamentosas perigosas. Consumidores que conhecem o produto são menos propensos a se envolver em práticas arriscadas e mais propensos a obter benefícios terapêuticos seguros e eficazes.
Considerações Finais
Os óleos essenciais oferecem um vasto potencial terapêutico, mas sua ingestão requer cuidados extremos e deve ser sempre supervisionada por um profissional de saúde qualificado. A segurança é a principal consideração, e seguir diretrizes rigorosas é essencial para prevenir efeitos adversos. Os consumidores devem estar bem informados e buscar orientação adequada antes de iniciar qualquer regime que envolva a ingestão de óleos essenciais. Assim, poderão aproveitar seus benefícios de forma segura e eficaz, minimizando riscos e maximizando a eficácia terapêutica.
Referências:
TISSERAND, Robert; YOUNG, Rodney. Essential oil safety: a guide for health care professionals. Second Edition. Elsevier Health Sciences, 2014
IFP. Safety guidelines. Disponível em: https://ifparoma.org/safety-guidelines/. Acesso em: 16 ago. 2024.
IFA Ingestion and neat application of essential oils guidelines. Disponível em: https://ifaroma.org/en_GB/home/public_employers/introduction-to-aromatherapy/ingestion-and-neat-application-essential-oils-guidelines. Acesso em: 16 ago. 2024
PAPO ESSENCIAL. Regras da ANVISA para fabricação e venda de blends e sinergias. Disponível em: https://papoessencial.com.br/regras-da-anvisa-para-fabricacao-e-venda-blends-e-sinergias/. Acesso em: 16 ago. 2024.
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (ANVISA). Formulário fitoterápico. Versão final em Word, 2 jan. 2024. Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/farmacopeia/formulario-fitoterapico/2024-fffb2-1-er-3-atual-final-versao-com-capa-em-word-2-jan-2024.pdf. Acesso em: 16 ago. 2024.